SI ou DÓ ?

Saudações,



                   


     Assunto corriqueiro entre os violonistas de 7 cordas é a afinação da sétima. Frequentemente encontramos dois tipos de afinação: DO – como usam os tradicionais chorões, afinação imortalizada por Dino 7 Cordas e ainda hoje a mais usada, ou SI –  que mantém as relações intervalares em quartas, facilitando sobremaneira o raciocínio quanto à montagem dos acordes e suas inversões.

          As variações de afinação fazem parte da história dos instrumentos de corda, principalmente o violão e seus ancestrais. A consolidação do violão e formação do repertório ao longo dos séculos se deu principalmente através de transcrições de peças de outros instrumentos, e o uso de scordaturas (do italiano: ‘desafinar’ – termo musical de origem italiana para definir a prática de afinar uma ou mais cordas de um instrumento em uma nota que não é a habitual, isto é, mudar a afinação normal da corda)  proporcionava melhor adaptação para o violão, além de ocasionais ganhos de extensão. É muito comum encontrarmos transcrições de peças renascentistas onde a corda SOL deve ser afinada em FA# e o RE no lugar do MI da sexta corda é comum ao repertório de todas as épocas.
Tradicionalmente o violão de 7 cordas tem a sétima afinada em DÓ. Quando passei a estudar o 7, senti muita dificuldade em adaptar as relações de intervalo entre as cordas – aquela coisa de ter um intervalo de quinta na corda imediatamente acima e na mesma casa – que construí durante anos estudando as inversões de acordes  entre as cordas MI, LA e RE. Por isso optei em afinar em SI, seguindo a sequência  de quintas (descendentes), o que me deixou mais à vontade e facilitou bastante a minha adaptação à corda adicionada.
    
     


                       

          Dino 7 cordas, o responsável pela criação e  consolidação  do idiomatismo do violão 7 cordas afinava sua sétima em DO. Creio que este seja o principal motivo  pela escolha da maioria dos “7 cordas” em usar essa afinação e faz bastante sentido. A quantidade de material de estudo para violão de 7 cordas ainda é  pequeno e o principal procedimento didático a que recorrem os iniciados no 7 é “tirar” de ouvido os acompanhamentos do Dino. Inclusive foi a primeira coisa que ouvi (e segunda e terceira e quarta…) quando busquei aulas de 7 cordas “- ah ‘tira’ todos os fraseados do Dino no disco tal do Cartola, ou do “vibrações” do Jacob do Bandolim” – me diziam e sei que muitos (ou todos!?) também ouviram isso.

Lembro de uma vez que perguntei a um professor o “- porque usar a sétima em DO?” e ouvi uma resposta que considerei um ponto final: “- Por que é DO!”.  Acho muita graça quando lembro, principalmente por vir de um grande violonista, o qual admiro muito. Já ouvi e li também que a razão de se usar tal afinação seja pelo fato de que muitos choros são compostos na tonalidade de DO, o que não é verdade. Os choros e sambas são tocados nas mais variadas tonalidades, dependendo do instrumento solista ou do cantor, e pra mim tal argumento é muito pouco convincente. Melhor argumento, na minha opinião, é o explicado por Maurício Carrilho: ” A única justificativa que eu encontro para esse hábito ter sido criado e passado, de geração a geração, pelos violonistas de 7 cordas, é a ausência de uma corda que sustentasse, com sonoridade, tensão e afinação satisfatórias, a nota SI na sétima corda”. Carrilho (2008) salienta também a dificuldade imposta aos violonistas, principalmente os da primeira metade do século passado, diante da precária tecnologia existente na época para amplificar e gravar o som do violão. Essa é a razão também pela qual Dino adaptou como sétima, a corda (DO) de violoncelo, provavelmente para compensar os precários microfones e gravadores de sua época – “Hoje encontram-se no mercado cordas de náilon e de aço com variados calibres e com diversas tensões, o que possibilita afinar a sétima em DÓ, SI e até LÁ, mas imaginem as cordas que China, Tute e mesmo Dino no início, tinham para usar”.
         Com o aumento do interesse pela consolidação de um repertório para o violão de 7 cordas, começam a surgir transcrições, arranjos e composições com a sétima sendo usada em diversas afinações. Como é o caso da dissertação de mestrado de Marcelo Teixeira (ver FONTES BIBLIOGRÁFICAS) onde encontramos transcrições de movimentos das suítes de Bach com a sétima sendo usada em DO, SI e LA. E a belíssima transcrição feita por Marcello Gonçalves para a peça escrita para piano TRISTOROSA de Heitor Villa-Lobos. Curiosamente, para esta transcrição, Marcello conta que precisou apena de afinar a sétima em LA e a transcrição fiel à partitura de piano estava pronta.


           
       


Eu optei por afinar a sétima do meu violão quase sempre em SI, pelos argumentos que envolvem a manutenção da relação intervalar entre as cordas, pela facilidade de inverter os acordes (principalmente com a 5º no baixo) e pela nota a mais (Sizão!?!?). Mas já está claro para mim que o legal é ser livre para afinar a sétima de acordo com a música e a ocasião.


Grande abraço!

        






FONTES BIBLIOGRÁFICAS


TEIXEIRA, Marcelo. O processo de transcrição para violão de
sete cordas
dos movimentos opcionais
das Suítes para violoncelo de Bach
. Dissertação de Mestrado. Curitiba,
2009.

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